Respeite o tempo. Talvez eu tenha mudado de opinião.

domingo, junho 09, 2019

E SE VOCÊ PRECISAR VOLTAR?

A memória é lindamente perigosa. Por um lado, temos convicção das lembranças e, por outro, não sabemos o que ocorreu de fato. Parece que o corpo humano não é tão brilhante como nós imaginávamos. Na verdade, vivemos a mercê de uma incógnita: – O que é real? Ou: – Até que ponto isso é real?




Às vezes me deparo tentando recordar como você era. A sua voz, o seu perfume, as nossas conversas, a forma como nos amávamos... Eu estranhamente não me lembro desses detalhes. Na realidade, a memória que me restou é falha em quase tudo quando se trata de você. E, ainda assim, você é você para mim.

É que, embora a memória não retrate com fidelidade todos os nossos momentos, eu não posso te retirar da minha história. Você existiu por um período. E me assombrou por vários períodos. A história de uma década de vida está conectada ao que você foi para mim: – amor: Do mais sutil ao mais agressivo. Mas, mesmo com os pesares, foi amor.

E, desse amor, encontrei as coisas que mais me encantam e as que mais me assustam. Do amor encontrei música, dança, leituras doces, fé e criação. Mas também encontrei o sofrimento, a traição, o medo, o ciúme e o pesar. Foram tantos encontros! E desencontros... Tão diferente do amor que nós almejávamos, não é mesmo?

Nós esperávamos uma história de amor extraordinária. E o que encontramos? Apenas uma história sobre duas pessoas que se amaram. Mas essa é a vida, não é? Um emaranhado de histórias em ordem desajeitada e não linear. São as linhas tortas que tanto falam por aí... 

É que fizeram com que acreditássemos que tudo está ao nosso alcance e que podemos controlar todas as coisas ao nosso redor. Mas, aos poucos, nós descobrimos que a vida é uma eterna tentativa de se equilibrar em uma corda bamba. Com seus fatores externos que estão longe do nosso controle...

[Se concentrar na corda] e [aceitar que não podemos controlar os fatores externos] seriam os segredos do equilibrista? 

Ora, não sei!

De fato, nem todas as coisas estão em nossas mãos, ao passo que devemos nos concentrar em resolver o que está dentro da nossa capacidade de modificação. E, partindo do princípio de que a corda é o caminho que nós trilhamos durante a vida, prestar atenção nela, visando manter o equilíbrio, é primordial.

Mas...

Nós passamos a vida escrevendo sobre os segredos da vivência. E com que propriedade o fazemos? Nós não vivemos a vida, por inteiro, para saber se estamos fazendo o correto. Tenha certeza: – até mesmo os mais bem-aventurados, deitam a cabeça no travesseiro, durante a noite, e possuem as suas dúvidas. Como eu poderia desvendar esse mistério e saciar a sua curiosidade sobre o certo e o errado?

As palavras que escrevo não trazem nenhuma sabedoria, meu amigo. São devaneios de quem anda por essas ruas sem qualquer intenção de continuar nesse caminho. Talvez tenha sido isso o que o seu amor me trouxe de mais bonito: a despretensiosa caminhada, de quem deixou tantas coisas para trás, e que – mesmo tendo perdido tanto – continua caminhando, sabendo que, a qualquer momento, é possível mudar a direção.

É... 

Parece que a memória é lindamente perigosa. Não me recordo de cada passo que dei para chegar até aqui, no entanto, caso precise voltar, saberei qual é o caminho.

Norte...
Sul...
Leste...
Oeste..

Eu perdi o medo.

quarta-feira, maio 22, 2019

TODAS AS COISAS BONITAS DESSA VIDA



Eu tentei escrever sobre todas as coisas bonitas dessa vida, mas concluí que talvez eu não tenha presenciado tantas belezas assim. Ou talvez eu só não tenha tido a oportunidade de enxergar as doçuras que eu gostaria de ter visto. O problema é justamente este, meu velho amigo. Sou eu. Eu que quis demais... Eu que esperei demais... Eu que limitei as belezas dessa vida.

Então eu voltei a escrever sobre as tristezas que nós enfrentamos ao longo das nossas jornadas. E, incrivelmente, eu passei a defendê-las. Eu, que nunca acreditei em destinos, me vi presa a ideia de que a vida é como ela é. Que as situações se ordenam quando elas devem se ordenar. E, que pequenos fragmentos de história, se tornam a história da humanidade, como se essa fosse a única verdade a ser encarada.

Mas o que sei sobre encarar as realidades que estão a nossa frente? Pois talvez eu saiba bem pouco sobre isso. Afinal, cá estou presa numa inquietação silenciosa. Transpassando cômodos como um fantasma. Numa total paralisia cotidiana onde tudo o que restou foi calmaria. Eu desejei desaparecer e eu desapareci. Mas, quando tudo aconteceu, desaparecer não soou tão bem quanto eu imaginei que soaria.

A arte que me restou foram as palavras e, elas me deixaram, depois que eu as traí. Eu deveria usá-las para escrever aquilo que sei ou aquilo que eu gostaria de saber, mas passei a usá-las para a defesa daquilo que não acredito, ensejando que as palavras fugissem de mim. Eu defendi o indefensível, e o preço foi perder a sensibilidade.

Ora, meu amigo. Eu estou cansada de morar nesse lar de fantasmas. Como retornar a inquietação não silenciosa, barulhenta, gritante? Gostaria de voltar a ser aquela menininha chata, mas genuinamente corajosa, e que tinha sonhos. No entanto, perder-se é, muitas vezes, irreversível. E eu já me perdi tantas vezes...

Naqueles braços... Naqueles lugares.... Naquilo que experimentei.... Naquilo que deixei para trás... Eu me perdi em cada esquina estranha que cruzei. E, às vezes, sinto que cruzarei mais esquinas apenas para me perder ainda mais. Talvez o meu destino seja este: Não me encontrar.

E desaparecer é o caminho.