Respeite o tempo. Possivelmente eu mudei de opinião.

quinta-feira, dezembro 18, 2014

18 dias de 12 meses

"O que desejo é libertar todas as minhas fraquezas, 
chorar até que acabe o fôlego, 
dormir até que os dias melhorem, 
afogar-me em toda a piedade gratuita, 
pedir todo o carinho e os abraços que me faltam, 
tornar-me a vítima que tenho todo o direito de assumir. 
Mas desejar nem sempre é poder, ou permitir, 
então engulo o desânimo e a dor 
e sigo a encarar, todos os dias, 
todas as pessoas que sempre 
só perceberão o que te falta, 
sem tempo para entender 
as dificuldades 
do que 
te cabe. 
Assim sigo,
independente 
de como me sinto, 
arrastando os 
dias como posso, 
regatando sonhos, 
tentando acreditar 
que as coisas boas vão sim 
perdurar, enquanto durar 
este pequeno intervalo, 
criado por novos anos 
que tão logo acabam, 
e que aprendemos 
a chamar de vida." 

 SOBRE A RESILIÊNCIA E A VONTADE DE ABANDONÁ-LA, POR LARISSA CARAMEL EM  OBIVIUS

SER MAIS QUE NAMORO, SER RELAÇÃO, SER AMOR

"Olhou e perguntou: “hei, você namoraria alguém que não fuma cigarros como você?”. Pensei em milhares de coisas que eu poderia explicar para aquela moça, contudo resolvi me conter. O tempo ensina melhor. Espero que ela aproveite a vida aprendendo com as oportunidades que o tempo nos traz. A fitei sem demonstrar muita atenção e respondi: “Essa diferença é a menor questão que encontrarás para ter uma relação”."




Os namoros e as relações se diferem. O namoro é a fase da paixão, de conhecer o outro, da insegurança e da inconsequência. A relação é a fase em que o amor entra na história, quando já há o conhecimento sobre o outro, quando há a confiança, o respeito mútuo, a aceitação do que o outro é –sobre as suas qualidades e os seus defeitos – e, sobretudo, quando é possível a convivência. O namoro constrói uma relação e quando, estreitas as relações, pouquíssimos eventos poderão encerrá-las. 

O amor só existe quando cessada a fase da paixão. E há no amor uma beleza incomparável! Tenho encontrado muitos namoros por aí, mas que esbarram em se tornar relações. Os namorados não conseguem resolver os seus conflitos. Não conseguem ultrapassar a fase de levar o ressentimento para a casa, de acumular mágoas e, então, numa discussãozinha qualquer, desabafar, jorrar tudo para fora. A grande dificuldade em um namoro se tornar uma relação é justamente o acumulo das mágoas. Eles não conversam sobre o que aconteceu hoje ou o que estão sentindo, não são completamente honestos e não se sentem confortáveis em ser, não há a confiança que é estabelecida em uma amizade. 

É preciso que o seu companheiro seja mais do que gostar de sexo, ele também tem que ser o seu amigo. A amizade estabelecida em uma relação trata do companheirismo, da aceitação e do respeito. Quando amigos, as pessoas se ajudam, se comunicam, se aceitam – e quando falo em aceitação, falo em aceitar não só as qualidades, mas também os defeitos. E, quando amigos, as pessoas se respeitam. Respeitam o tempo, os outros amigos, os dias ruins e respeitam os silêncios. 

Respeitar os silêncios é o desafio da convivência e este é a base de um relacionamento. Tolerar a convivência é aceitação dos dias em que o companheiro passou por um grande problema em seu trabalho, chega cansado em casa, desejando o silêncio. Ter a nitidez e a confiança de que aquele silêncio não é contra você, é saber respeitar o espaço do outro. A paixão não possibilita isso, contudo o amor necessita dessa tolerância para se tornar o que ele é. 

As pessoas acreditam que irão construir uma relação de longos anos com a pessoa que o faz sentir-se como se tivesse quinze anos. Não! Isso é namoro. Relação se constrói com a pessoa que lhe faz sentir-se maduro. A paixão tem a ver com os desafios, a intolerância, o ciúme absoluto. O amor trata das coisas bonitas e serenas, da maturidade, da amizade e da paz. 

Assim, aqui encontramos um ponto importante: Para nos tornarmos relação é preciso somente do outro? Não. A relação, o amor, começam por você. De você. 

Me questiono demasiadas vezes sobre onde está a dificuldade do futebol de quarta-feira, da noite do pôquer com os amigos ou da “amiguinha”? Onde está o problema com a roupa curta, a noite entre amigas e o cabelo por fazer ou a falta de maquiagem? O problema é a não aceitação, a não confiança, a falta de cumplicidade, a parábola em ser relação. A questão é a cobrança sufocante de querer que o outro seja o que você pensa que você precisa. Você não pode cobrar isso de outra pessoa. Se você deseja amar alguém, precisa aprender a aceitar o que o outro é, e somente assim, se sentirá confortável ao lado daquela pessoa. 

Os ingredientes de uma relação são poucos e, quando praticados, percebemos que são fáceis: companheirismo, respeito e amor. Ah! Se os namorados soubessem o quão é bom ter intimidade o suficiente para ser amigo do seu companheiro! Talvez o mundo estivesse livre de tantas separações... – Alias, o mundo hoje é quem cobra mais. – Cobra tanto que será preciso três planetas para ser suficiente às pessoas que ele vem construindo – uma humanidade cada vez mais competitiva, que finge ser tolerante em suas leis, e, de amor, pouco se pratica. A junção da paz e do amor, embora blasé, ainda é a solução para a humanidade. 

Não há a necessidade de buscar a pessoa mais bonita da cidade, é preciso encontrar um amigo. E, permitindo esta amizade, tenha a certeza: este amigo será a pessoa mais bela, para você. E, no final, é o que importa – você e a pessoa amada, nada mais.  – Olha, moça, os cigarros podem ser apagados, e, ainda assim, aquele namoro não se tornar uma relação. 

domingo, dezembro 14, 2014

14 dias de 12 meses

"O ser humano é dotado de vontade. E pode usá-la para escolher entre o bem e o mal. Se só pode fazer o bem, ou só pode fazer o mal, é uma laranja mecânica – significa que tem aparência de um organismo adorável, com cor e suco, mas que na realidade é um brinquedo mecânico para ser manipulado por Deus ou pelo Diabo ou (que o está substituindo cada vez mais) o todo-poderoso Estado – é tão inumano ser totalmente bom quanto totalmente mau. O importante é a escolha moral. O mal tem que existir junto com o bem, de modo que a escolha moral possa existir.”

LARANJA MECÂNICA, ANTHONY BURGESS

MULHER DESVARIADA

"No final da cerimônia, o pastor gritou o meu nome, fui até ele e me perguntou: “Por que é que chegaste atrasada em todos os cultos?”. Eu pensei duramente durante dez segundos em lhe mentir, mas me recordei que seria uma espécie de pecado tentar enganar o servo do Senhor e lhe fui honesta: “Sabe, senhor pastor, eu penso que os cultos são demorados e tenho demasiada preguiça, então me atraso para que termine mais depressa. Sei, sei, sei, o senhor não precisa dizer! Estou errada! Mas a Ritinha disse que, poderia ser pior, eu poderia ser como aquelas pessoas que não frequentam a nossa igreja. Eu poderia não vir, no entanto, mesmo atrasada, estou aqui todos os sábados.”. O pastor me fitou severamente e respondeu: “É como aquele funcionário que quer aumentar o seu salário mas apenas enrola durante o serviço. Vai todos os dias trabalhar, contudo não produz nada. É trapaça.”."

(Ilustração de Molly Crabapple.)


Causava-me medo tentar decifrar o que existia dentro da cabeça de Inácio e, ainda assim, sou repleta da certeza de que lá, o mundo era mais interessante. Quieto, Inácio parecia não existir. E, por não existir, todos o queriam por perto. Pela inteligência exposta sem receios, a irreverência que chateara alguns e a doçura que aparecera quando menos se esperara, Inácio era bem vindo em todos os lugares. Ele era um bom homem. 

Ao longo de seus quarenta e dois anos, Inácio conhecera Caterina. Caterina fora uma moça inteligente, bonita e doida. Desvariada! À ela não se apeteceria horários, nem regras, muito menos formulas ou zodíaco. Caterina fizera os seus próprios princípios e se sentira desafiada por todos que a subestimavam. A moça era uma competidora por natureza. Não aceitara “nãos”, adorara desaforos e, poderia lhe causar tristeza, mas ela apenas se apaixonara pelos que não se apaixonavam. 

Foi ao quieto e intrigante Inácio que Caterina entregou a sua última gota de amor. A gota d’água. À ele, ela entregou toda a sua devoção, todos os seus desvarios e o seu corpo, em carne e alma. Caterina doou ao amargo Inácio, aquilo que apenas as pessoas de corações corajosos podem doar: princípios. Talvez fosse isso que fizesse Inácio ficar ao redor de Caterina quando todos já haviam ido embora, aquilo que ele nunca recebera dos pais, lhe era entregue por uma mulher doida. 

Inácio, apesar de todas as aventuras e todos os lugares que conheceu, era um homem antiquado. Ele não aceitara o fato de que, quando ninguém o enxergara, se sentia apaixonado pela doida Caterina. Ela falara sobre sexo num tempo onde ainda era opressão, abordara os outros homens com carinho e sem remorsos, não era mocinha de pernas-cruzadas e bons costumes, então, o que é que aquela mulher haveria de ter que era tão atraente? 

A consideração. Apesar da falta de modos, o coração daquela mulher era lindo! Enquanto Inácio se divertira com mil e uma mulheres, Caterina parecia esperar Inácio. Ela entendera que Inácio não firmaria com ela um compromisso de fidelidade, no entanto ela sempre acreditou no homem ser-humano. Para Caterina, há homens e mulheres quais são apenas homens e mulheres. Contudo, ela acreditara que tanto os homens, quanto as mulheres, poderiam se tornar seres humanos. Poderiam se encher da humanidade simples e bonita. 

À aquela mulher, não importara as regras e as boas maneiras de uma sociedade: drogas proibidas, sexo como libertinagem, más-línguas e dez mandamentos. Não... Para aquela doida, o que importara era a bondade das pessoas. Os seus princípios eram a fé, o respeito, a compaixão e a consideração. Princípios que resumiam o que, para ela, era amor. 

A consideração equivale ao homem que anda pelas ruas, quando uma senhora tropeça, derruba suas compras e ele a ajuda a se levantar, e a resgatar as suas compras jogadas ao chão. O amor equivale ao homem que a ajuda a se levantar, pega as compras e acompanha aquela senhora até a sua casa. 

Consideração é algo minúsculo que todo o homem e toda a mulher necessita ter para se tornar um ser que é humano. Quando Inácio atacara as mulheres, e as amigas, que rodeavam Caterina, ele não tinha consideração para com ela. Ele não era um homem com alma humana, ele era apenas um homem, que às vezes se revelara bom e, noutras vezes, era quieto. Quieto ao ponto de se tornar omisso. Um erro grave à ser cometido por uma pessoa é a omissão. Enxergar algo, e não exteriorizar, é como perder uma oportunidade. 

Ser omisso equivale ao homem que anda pelas ruas, quando uma senhora tropeça, derruba suas compras, e, então, ele não a ajuda a se levantar. Ser medíocre equivale ao homem que não a ajuda a se levantar, passa por ela de cabeça erguida e ainda pisa em suas compras. Acredite – há homens com tamanha crueldade. Acredite – Caterina ainda preferira caminhar sozinha do que estar ao lado de pessoas não-humanas ou medíocres. 

Mas, Inácio, como já dito, era um bom homem, embora não humano. Ele perseguira as injustiças em seus discursos e, por descuido, não percebera que era um homem injusto. Não notara a falta de consideração que ele praticara com Caterina. Talvez este seja outro erro: ser leviano, se descuidar, não se importar tanto assim...

Aos que não se importam, a vida passa depressa e sem flores durante o caminho. Aos que se descuidam, perdem oportunidades valiosas de fazer a vida ser bonita. Aos levianos, que tentam enganar a vida e a eles mesmos, é como um tormento – tudo lhes é fardo, é pesado, é injustiça – mas, em realidade, são eles mesmos que dramatizam a vida. 

Caterina soubera o caminho que Inácio tentara trilhar – o caminho tortuoso. Ao deitar, todas as noites, ela se desculpara com o seu deus por não conseguir fazer Inácio enxergar os encantos da vida. No entanto, acho que a própria Caterina não se desculpara. Inácio fora um desafio perdido, um homem que ela não conseguira encantar, alguém que não se jogou aos seus pés. Mas, porquanto, uma qualidade daquela mulher doida – ela soubera desistir. Fechou o livro e iniciou uma nova leitura.

quinta-feira, dezembro 11, 2014

A.

"Toda a gente tem medo da intimidade — ter ou não ter consciência desse medo é outra história. A intimidade significa expor-se perante um estranho — e todos nós somos estranhos; ninguém conhece ninguém. Somos mesmo estranhos a nós próprios, porque não sabemos quem somos. 
A intimidade aproxima-o de um estranho. Tem de deixar cair todas as suas defesas; só assim a intimidade é possível. E o seu medo é que se deixar cair todas as suas defesas, todas as suas máscaras, quem sabe o que o estranho lhe poderá fazer. Todos nós andamos a esconder mil e uma coisas, não só dos outros mas de nós próprios, porque fomos criados por uma humanidade doente com toda a espécie de repressões, inibições e tabus. E o medo é que, com alguém que seja um estranho — e não importa se se viveu com a pessoa durante trinta ou quarenta anos; a estranheza nunca desaparece —, parece mais seguro manter uma ligeira defesa, uma pequena distância, porque alguém se poderá aproveitar das suas fraquezas, da sua fragilidade, da sua vulnerabilidade. 
Toda a gente tem medo da intimidade. O problema torna-se mais complicado porque toda a gente quer intimidade. Toda a gente quer intimidade porque, de outro modo, está sozinho neste Universo — sem um amigo, sem um amante, sem ninguém em quem confiar, sem ninguém a quem abrir todas as suas feridas. E as feridas não saram se não forem abertas."

OSHO, em "INTIMIDADE"

OUTRA VEZ É NATAL

"Eu estava perto dos dez anos de idade quando me deparei pela primeira vez com a injustiça. Diego, treze anos, forte e filho de papai rico, derrubou o lanche de Luan, oito anos, negro, filho do funcionário de pai de Diego, pisou em cima do sanduiche que a mãe de Luan preparara com todo o amor materno que se espera de uma mãe e, disse, “tempero especial pro nêguinho”. Me calei. Retornei da escola para a casa num total e misterioso silêncio. Mamãe insistia em saber o que acontecera comigo, e eu lhe repetia: “nada, nada”. No outro dia, sem hesitar, coloquei pimenta, muita pimenta, no sanduiche de Diego. Enquanto chorava ao lavar a boca que ardia, eu lhe disse: “tempero especial para o branco”. Na volta, meu sorriso era estonteante. Cheguei correndo para contar para o papai o meu ato de coragem e justiça, mas, de repente, a surpresa. Papai deu um tapa em minha mão e avisou: “Tome cuidado para não combater crueldade com crueldade.”."



Mas outra vez as pessoas se preparam para o Natal. E, cá estou eu, meu amigo, em mais um dezembro de reflexões. Ah! Meu mês do ano favorito! Seja pela união das famílias ou seja pelo tempo que encontro para retornar a casa nove, deitar no colo de minha mãe, pedir desculpas e conselhos. Eu venho a trilhar um caminho sem cores e me apetece demasiadamente enfeitar essa trajetória. Encontrei supina dificuldade para cultivar flores nessa estrada, mas o mar nos pede outra vez: paciência, paciência e paciência, o meu presente chegará. 

Conheci um rapaz. Ele é como você, meu amigo. Mesmos traços e mesmos defeitos: solidão. Olhar para ele é como enfrentar um espelho que reflete o meu passado e, me surpreender, eu perdi o controle. Eu finalmente entendi o que acontecera todas as vezes que você me ferira, não era falta de amor, era excesso de solidão. Você saía dos trilhos, dava-lhe as costas e, mesmo com o barulho do apito, não queria lhe dar a sua confissão. – Não se preocupe, não cometerei os seus erros. – Eu irei me confessar. 

O poeta nos disse que é impossível ser feliz sozinho. A felicidade só nos é completa quando podemos compartilhá-la com as pessoas que amamos. Mas para nós, que nos perdemos, só o que nos resta são estas cartas não endereçadas que se comunicam em segredos e dividem experiência, no entanto não suprem a falta de um abraço. Eu espero que tu estejas feliz e que, no seu caminho, não exista mais espaço para a solidão. 

O rapaz que eu conheci é cheio de discursos. Enquanto eu o escuto em seus discursos, não tão ensaiados, sobre política, me questiono onde fica a sua generosidade. Ele ainda não compreendeu que criticar os que estão lá em cima, não faz diferença quando não somos bons com os que nos rodeiam aqui em baixo... Afinal, nós bem sabemos, os pequenos atos que mudam o mundo começam por nós.

Ele também desvia a atenção dos dias mornos com analgésicos e músicas sem letras. Não sei se foge da própria solidão ou se, por algum motivo, tem fé de que sozinho haverá paz. Às vezes percebo que ele também está perdido e que, da vida, ele quer poucas coisas. Eu sei que você espera que eu conte, nesta carta, as palavras que eu doei ao rapaz sobre esperança, amor e futuro. Mas eu não o fiz. É que, preciso dar-lhe a minha confissão, eu me perdi. 

Já se passaram três anos e a vida é mais leve. Eu trilhei o meu caminho sem a sua presença, meu amigo. Eu escolhi ser só. Por mais que a minha alma suplique sair voando por aí, eu já me desacostumei com a companhia das outras pessoas. Elas chegam aqui, sentam no sofá, nós deixamos de lado os tabus sobre sexo e drogas, mas de amor – ah! De amor nós não falamos nada... 

A humanidade caminha para um futuro preto e branco. Todos os dias, quando acordamos, o telejornal nos traz as novas diretrizes: assaltos, crueldade e a depressão, o mal do século. Os jovens se encontram solitários todas as sextas-feiras em noitadas e são restritos em suas frases prontas do não-amor: “não quero namorar, amar é sofrer, ser solteiro é mais divertido”. Contudo, retornam às casas de número nove, sozinhos e com a sensação de tristeza. É por isso que eu ainda me encanto com as pessoas que fogem dos discursos prontos e têm a coragem de gritar aos quatro cantos o que elas desejam. Por isso que me desperta encanto estar ao lado de quem não usa máscaras.

É árduo se colocar em frente ao outro de alma limpa quando não se tem mais quinze anos e, por não ter mais quinze anos, somos assombrados com o medo de nos tornarmos ridículos, ao mesmo tempo que, quebramos todos os tabus do que antes era insegurança. Nós sabemos como são as pessoas e o preço que iremos pagar ao nos entregarmos a elas, mas já perdemos a noção da hora, pedimos outra bebida e a noite termina como todas as outras: sexo sem muita conversa, dividir corpos sem que aconteça algum encanto e, no outro dia, nem oi, nem ligações. 

Nós nos fechamos para o amor. E, meu amigo, que sentido há na vida se não tivermos alguém para amar? Nós cometemos todos os dias os mesmos erros, com as mesmas pessoas e aqui dentro só nos resta o mesmo vazio aberto há mais de vinte anos quando deixamos a barriga de nossas mães. – Deixei de ser dois, eu e minha mãe, e passei a ser um. O destino de todos nós...

Esse um que, apesar dos tropeços da vida, tenta semear as boas coisas que já aprendeu. Eu me perdi e já me confessei, meu amigo. Mas eu quero retornar aos trilhos, porque eu ainda acredito em tudo aquilo que eu lhe fiz acreditar. É preciso muito mais que dias monótonos e vidas secas, é preciso que, ao fim de nossas vidas, tenhamos fôlego para contar sobre os fôlegos perdidos com um amor – aquele amor – que desafia ao mesmo passo que nos fornece paz.

Eu preciso arrastar os móveis do lugar e preciso me divertir no sol. Eu necessito resgatar a criança que combatia a crueldade, que olhava as pessoas com o brilho nos olhos e que de amor... Ah! De amor falava pelos cotovelos! Porque é o amor que nos move. Tu te lembras? "Se eu não te amasse tanto assim, talvez não visse flores por onde eu vim e, vivesse só, na solidão...". Eu me recordo e cultivo flores. Eu preparei o meu coração para voar. 

sexta-feira, outubro 03, 2014

03 de 10




"Vou te contar 
Os olhos já não podem ver...
Coisas que só o coração pode entender.
Fundamental é mesmo o amor, 
É impossível ser feliz sozinho.

Da primeira vez era a cidade,
Da segunda, o cais e a eternidade."

ATRAVESSE AQUELE MURO

“Ah, se eles soubessem! Se, por questão de segundos, pudessem imaginar como seria o amanhã... Talvez não virassem a esquina, não acenderiam o cigarro, não teriam se despedido. – Trapaça! Trapaça! É o que penso da vidente da Rua 25. – Lá no fundo, todos sabem: esse tal de futuro, meu amigo, não existe.” 


Imagem do filme The Boy in the Striped Pyjamas 
(O menino do pijama listrado)
Ano 2008,  baseado no livro de John Boyne

Vive corajosamente quem acredita em destinos. Eu não sei esperar. Filas de bancos, ir embora sem abraçar, trânsitos... Ah! Grandes perdas do nosso tempo! Isso é engraçado, meu amigo. As pessoas vivem como se elas tivessem tempo. Há loucura maior do que crer em algo que não existe? Pois bem, o próximo minuto não existe ainda. – É mais do que uma questão de fé, é uma questão de coragem. É como se, todos os dias, nós colocássemos tudo a perder. 

Insisto nesse assunto de não perder chances. Dar-se uma chance, voltar atrás, tentar outra vez é bravura! É tão bonito quando alguém entende que as oportunidades são poucas. Certa vez conheci um senhor que com seus noventa e três anos disse: “só tive nove chances durante a minha vida e perdi a maioria.”. Ah! Meu doce amigo! Eu quero ser dessa gente que tem cinco e vive as cinco! 

É como se essas pessoas não sofressem nenhum tipo de medo. Elas não têm receio de apostar no amanhã e, quando o amanhã chega, vivem num lamento sem fim. Vivem num eterno esperar. Acho que não ter pressa não é um problema, mas confiar que tudo irá se resolver sem que caia sequer um pingo de suor é como atirar no próprio pé. Joaquim já soubera disso quando construiu muros em sua casa. Os muros são assim: você constrói porque não tem fé. 

Tem gente que constrói barreiras para as melhores coisas dessa vida. Meu amigo, hoje em dia, todo lugar que tu vais, encontras pessoas que falam que não querem se casar. Elas dizem não acreditar no matrimônio, nem no próximo, nem no amor. No entanto, eu me questiono e talvez eu seja mesmo esse cara ainda careta que acredita tanto e tem tantas filosofias atrasadas, que o poeta estava perfeitamente correto quando afirmou: “é impossível ser feliz sozinho”. Podem jorrar discursos de independência e juventude, no final, todos querem encontrar a tampa da sua panela. 

Mas eu não entendo o por quê de tantos impedimentos. – São tantos tantos e nenhum nada! – Se elas falam por aí que acreditam em destinos, por que sofrem tanto à demonstrar o que querem? Essa braveza e força dos nossos jovens é tão falsa quanto o cabelo da senhora da casa 121, da Rua Cajuzinhos. E faz mal. 

Faz mal colocar as suas procuras nas coisas erradas. Eles se divertem equivocadamente, eles esquecem da política, eles compram coisas que não precisam, eles rebatem ofensas, eles não têm fé, eles dizem não ao amor, eles perderam o controle. Acreditam que ser alegre é ter tudo, quando, na verdade, são as poucas coisas que temos que nós devemos transformar em alegria. 

A felicidade não depende dos relógios na parede, não pode estar sujeita a ter ou não aquela pessoa em sua vida, não pende da vivência de algo ou alguém. Precisamos aprender a sermos felizes com nossos próprios passos e com o que temos agora. Precisamos praticar algumas regras importantes: nunca ir embora sem se despedir, não reclamar tanto, agradecer sempre, abrir e deixar abertas todas as portas, abraçar oportunidades, pedir desculpas, fazer agora o que pode ser feito depois e não crer no amanhã, porque, meu amigo, o amanhã não haverá. 

Não coloque a sua felicidade nas mãos de outras pessoas. Ela é unicamente sua e depende só de você. Descubra o que faz o seu coração vibrar e dedique-se. Não desista. Diga menos nãos a vida. Abrace árvores, que seja! A verdade cruel é que todos estamos submetidos a falta de lucidez. Ilumine-se.

quinta-feira, setembro 25, 2014

25 de 09



"See the way she walks 
Hear the way she talks 

You're put down in her book 
You're number 37, have a look 
She's going to smile to make you frown, what a clown 
Little boy, she's from the street 
Before you start, you're already beat 
She's gonna play you for a fool, yes it's true..."

FEMME FATALE, The Velvet Underground 'n Nico 

BABY, YOU'RE A RICH MAN

"E escrever sobre o quê em uma segunda de manhã? Ah, talvez eu possa discorrer sobre a bagunça. Tudo o que construímos está perdido por aí. Nem as músicas são as mesmas, quem dirá as pessoas! Quem poderia imaginar que o tempo realmente iria passar depressa? As estações são outras, primavera não é mais primavera. O verão é insuportável, ninguém mais vê o outono, e, o inverno... hunff, o inverno atormenta as nossas lembranças."



Ele ainda se senta no mesmo banco da praça quatorze, você sabia? Escuta aquela música esquecida pela tropicália e discorre poemas sobre a velha vida. Ele tem medo. Quando abre os olhos pela manhã, a cama está vazia, a televisão ligada no canal do telejornal e, todas as manhãs, tem a impressão de que a porta está se abrindo. Não está. Ele descobriu o que é a solidão. 

Ele pensa durante todas as refeições, que é quando tem descanso para se lembrar, nas mortes que enfrentou naqueles anos. Carrega o peso da culpa como se pudesse ter feito algo para que fosse diferente. Talvez, oh, talvez ele pudesse. Acho que aquelas pessoas morreriam da mesma forma, mas ele poderia ter se doado mais. Poderia ter feito uma ligação durante a noite, ter ido passar os domingos ao lado deles, ter segurado suas mãos enquanto estavam deitados naquela cama imunda de hospital. Ele poderia ter demonstrado como se sentia. 

O que anda acontecendo com todos nós? Estamos padecendo do medo de amar. Não queremos que, a multidão de pessoas que nos observam, confunda nossos sentimentos com fraqueza. Rapaz, sendo franco, temos medo de sermos chamados de viados. Quebramos tantas barreiras de preconceitos e, no entanto, nós mesmos nos mutilamos. Não acredito que seja apenas a prevenção para que não nos machuquemos, é receio do que as outras pessoas irão pensar. 

Você sabia? Ele pega o ônibus todas as manhãs, dois reais e vinte centavos na passagem, vai até o trabalho sentado naquele assento que está com o estofado rasgado e fica a pensar no que os vizinhos pensariam se ele largasse a faculdade, o emprego sonhado, a namorada tão cheia de graça e inteligência. Se pergunta insistentemente se ele está fazendo o que é certo. Quando o dia chega ao fim, tem a certeza de que fez o que era correto, mas continua descontente. Rapaz, com a sua idade, ninguém deveria manter-se insatisfeito. 

Não quis decepcionar as outras pessoas e decepcionou a si mesmo. Rapaz, eu lhe avisei: tudo nessa vida precisa de um equilíbrio. Não decepcione quem amas, mas não decepcione a si. Enquanto aos seus vizinhos, eles são pessoas que pensam saber tudo sobre você, porém não o conhecem. Não dê tanta importância assim. 

Ele sabia que precisara ter estado mais com eles. Não precisara seguir a profissão que eles tanto sonharam para o seu caminho, só precisara doar-lhes um pouquinho do seu amor. Um beijo na testa, um eu te amo às vezes, um abraço no natal... eles só desejavam o afeto daquela criança que eles cuidaram com tanta dedicação. Eles eram os seus pais. 

Do que adianta a saudade, rapaz? Pai e mãe só vivem uma vez. “Eles morreram”, pensou durante o jantar. “Eu não me despedi”, durante o almoço. “Sonhei com eles, outra vez”, durante o café. O mundo parecia andar ao contrário. Os ponteiros do relógio já não o obedeciam, e, de repente, estaria atrasado para o emprego. 

Aquela vidinha chata. Aquela trava de demonstrar o que sentia. O receio de que os amigos descobrissem que ele era sensível. O amor por uma prostituta e o namoro forjado com uma mocinha de família. Essa foi a vida que ele escolheu, você sabia? 

Ele nega, diz que escolheram por ele, que ele se perdeu. Ah! As drogas não irão justificar as suas ausências depois que tudo acabou. A vida era sua! “Dane-se o que pensam”, enquanto buscara a sua rota de fuga. No entanto tivera receio do que os vizinhos iriam contar para os seus pais. Vinte e tantos anos nas costas, rapazinho, e a mamãe ainda lhe prende pela barra da saia? Não, não estou debochando. Estou tendo pena. 

Pena, eu lhe disse por muitas vezes, é o pior sentimento que podemos sentir pelo outro. Ninguém precisa ter pena de você, ninguém vai lhe amar por pena. Serão poucas as pessoas que irão lhe estender a mão com compaixão quando estiveres caído. Você – rapaz – não causa pena em ninguém. Foram as suas trajetórias em rodovias escuras que lhe trouxeram até aqui. 

Jogue fora os seus remédios, desarme as suas barreiras, estude Matemática e não Direito, compre chinelos, trabalhe de bermudas, ande devagar, não pegue ônibus, vá de bicicleta. – Visite o túmulo dos seus pais. Não cometa o erro de amá-los menos do que eles merecem. – Não dê menos amor as pessoas que ainda estão aqui. Ligue. Mande cartas. Não espere por natais que acontecem uma vez por ano, mas passe domingos que ocorrem com mais frequência. Se desligue das pessoas que não irão te levar a algum lugar. Cerque a sua vida de coisas boas. Trabalhe no que lhe der vontade, ame seu trabalho, trabalhe seu amor. – Rapaz, você sabia que eu ainda sento no mesmo banco da praça quatorze?

segunda-feira, setembro 22, 2014

22 de 09


"Você sai e não explica, 
Onde vai e a gente fica,
Sem saber se vai voltar. 
(...) 

 Diz que é pra tomar cuidado, 
Sou um desajustado, 
E o que bem lhe agrada, meu bem.

"Mas fica, 
Mas fica, meu amor. 
Quem sabe um dia, 
Por descuido ou poesia, 
Você goste de ficar..."

FICA, CHICO BUARQUE

EU NASCI ASSIM

“Mesmo que não fosse dona de vários pares de sapatos, era grata por ter um par para calçar os pés. E, mais, era grata por ter pés para andar descalça.” 



Não terminou os estudos e nem falara mais de um idioma. A mãe só tivera dinheiro para as prestações do carro, casa e supermercado. O pai falecera há doze anos. Filha única, metida a revolucionária. Sentara no bar e criticara a política do país. Não vestira saias, não usara maquiagem, não cruzara as pernas para se sentar. Pouco lhe importara agradar ou não aos demais. Irreverente, cabeça dura, não soubera cozinhar e as gírias das suas orações me confundiam. O que eu vira naquela mulher? 

Temia ter que dar satisfações, pegara o carro e andara sozinha pela madrugada, parecia não ter medo de nada, mas tivera. Tivera medo de se envolver, de não ser amada como a mãe não foi, de ser “assim” para sempre. Tivera sede de mudanças, queria renovar-se a todo instante, não permanecia com as mesmas opiniões por muito tempo. Nunca vi em seus olhos a vontade de ser melhor do que as outras pessoas, apenas a vontade de ser melhor do que ela mesma. Talvez fosse isso – a voz cansada, o brilho nos olhos, o mistério de ser quem era. 

Ao mesmo tempo que era debochada, envergonhava-se em me fitar na multidão. Quando os olhos se encontravam, ficara vermelha, atrapalhava-se, perdia-se no acanho de demonstrar seus instintos. Não conheci ainda alguém que a tenha desvendado melhor do que eu, e, muitas vezes, ela não se revelou. O que queria aquela mulher? 

Parecia não se importar com o resto do mundo. Ali, sentada em seu silêncio, observara a festa e as pessoas como alguém que não compreendia. Mas o que me deixara intrigado, era que ela não tivera vontade em compreender. Era como se no mundo dela não houvesse lugar para muitas pessoas, não existiam endereços e aposto em poucas lembranças. Quem tentara entrar, perdera pedaços no caminho; quem não tentara, ficara a desejar suas esquisitices. 

Quem era aquela mulher inconstante, desapaixonada, que os olhos mantinham-se avermelhados e o sorriso era tão divertido? Ah! Zézim! Ela era tão bonita! Não porque pesara 53 kg, cabelos longos e pele limpa. Não. Era bonita porque era. Porque não tinha a forma das outras, porque não queria ser igual, porque rejeitara meus afetos e se parecia tanto comigo! (Suspiros). Porque o abraço apertado era tão confortável! Tão imenso! Tão doce! E eu o queria... Eu queria aquele abraço só para mim...

Por tantas vezes tive a ilusão de que ela também o queria, mas não, Zézim. Ela não tivera donos, meu amigo. Era do mundo, do mundo dela. Do jeito dela. Com aquelas esquisitices e ideias mirabolantes, ela era a mulher que me roubou encantos e foi embora sem se despedir. Num ateliê de sonhos e com duas passagens em mãos, ela me deixou por momentos de alegria. 

Então, eu me pergunto, quem é que troca um amor por momentos? Como alguém pode ser tão cruel e largar tudo para viajar, sem deixar notícias? Sem cartões-postais? Sem nem ao menos uma mensagem na caixa postal... 

Zézim, eu já sei. Vais me dizer: “acorda, rapaz bobo! Ela não te amara”. As pessoas simplesmente não se interessam tanto às vezes, não é? Elas não têm a intenção de nos conquistar, não almejam casar-se e ter filhos, querem, sei lá, viver uma vida sem esperas. Elas não calculam o mal que nos causam. Não foi intencional, certo? Foi sem querer que ela me machucou. Fui eu, na realidade, que me deixei levar. Que acreditei em palavras que não eram promessas, que criei realidades, que sonhei tão alto... 

Mas, Zézim, quando é que vai chegar a pessoa que vai tirá-la daqui de dentro? Preciso esquecê-la, preciso deixá-la para lá e percorrer novos trajetos. Quero viver, amigo. Quero ser livre desses sentimentos ruins e manter-me leve. Quero ser ela. Quero ser aquela mulher que todos desejam, sem conhecê-la e que, nem eu, que convivi por vinte anos, a conheci. 

Quero voltar a ter quinze anos, Zézim. Quero rejeitar essa cobrança com espelhos e quero deixar meu amor ir, sem lágrimas. Quero ser forte como falam que aquela mulher é. – Zézim, eu quero sê-la. – E quero que, ao completar meu desejo, ela tenha orgulho de mim. Eu sei, Zézim... Eu sei... Sou menino bobo. Quem se importa com quem partiu o seu coração? É que, não sei, meu amigo. Eu acredito que um dia, cara-a-cara, ela resolva ficar. Por descuido ou poesia, ela talvez permaneça.

quinta-feira, setembro 18, 2014

18 de 09

45 lições que a vida ensinou 
Para compreensão da publicação anterior.

Escrito por Regina Brett, publicada na coluna do The Plain Dealer, Cleveland, Ohio, na celebração de seu 90º aniversário. 

"1. A vida não é justa, mas ainda é boa. 
2. Quando estiver em dúvida, dê somente o próximo passo, pequeno . 
3. A vida é muito curta para desperdiçá-la odiando alguém. 
4. Seu trabalho não cuidará de você quando você ficar doente. Seus amigos e familiares cuidarão. Permaneça em contato. 
5. Pague mensalmente seus cartões de crédito. 
6. Você não tem que ganhar todas as vezes. Concorde em discordar. 
7. Chore com alguém. Cura melhor do que chorar sozinho. 
8. Pode ficar bravo com Deus. Ele suporta isso. 
9. Economize para a aposentadoria começando com seu primeiro salário. 
10. Quanto a chocolate, é inútil resistir. 
11. Faça as pazes com seu passado, assim ele não atrapalha o presente. 
12. É bom deixar suas crianças verem que você chora. 
13. Não compare sua vida com a dos outros. Você não tem idéia do que é a jornada deles. 
14. Se um relacionamento tiver que ser um segredo, você não deveria entrar nele.
15. Tudo pode mudar num piscar de olhos Mas não se preocupe; Deus nunca pisca. 
16. Respire fundo. Isso acalma a mente. 
17. Livre-se de qualquer coisa que não seja útil, bonito ou alegre.
18. Qualquer coisa que não o matar o tornará realmente mais forte. 
19. Nunca é muito tarde para ter uma infância feliz. Mas a segunda vez é por sua conta e ninguém mais. 
20. Quando se trata do que você ama na vida, não aceite um não como resposta. 
21. Acenda as velas, use os lençóis bonitos, use roupa chic. Não guarde isto para uma ocasião especial. Hoje é especial.
22. Prepare-se mais do que o necessário, depois siga com o fluxo.
23. Seja excêntrico agora. Não espere pela velhice para vestir roxo.
24. O órgão sexual mais importante é o cérebro. 
25. Ninguém mais é responsável pela sua felicidade, somente você.. 
26. Enquadre todos os assim chamados "desastres" com estas palavras 'Em cinco anos, isto importará?' 
27. Sempre escolha a vida. 
28. Perdoe tudo de todo mundo. 
29. O que outras pessoas pensam de você não é da sua conta. 
30. O tempo cura quase tudo. Dê tempo ao tempo.. 
31. Não importa quão boa ou ruim é uma situação, ela mudará. 
32. Não se leve muito a sério. Ninguém faz isso. 
33. Acredite em milagres. 
34. Deus ama você porque ele é Deus, não por causa de qualquer coisa que você fez ou não fez. 
35. Não faça auditoria na vida. Destaque-se e aproveite-a ao máximo agora. 
36. Envelhecer ganha da alternativa -- morrer jovem. 
37. Suas crianças têm apenas uma infância. 
38. Tudo que verdadeiramente importa no final é que você amou. 
39. Saia de casa todos os dias. Os milagres estão esperando em todos os lugares. 
40. Se todos nós colocássemos nossos problemas em uma pilha e víssemos todos os outros como eles são, nós pegaríamos nossos mesmos problemas de volta. 
41. A inveja é uma perda de tempo. Você já tem tudo o que precisa. 
42. O melhor ainda está por vir.
43. Não importa como você se sente, levante-se, vista-se bem e apareça. 
44. Produza! 
45. A vida não está amarrada com um laço, mas ainda é um presente.”

EU PREFIRO SER...

“Fitou-me cuidadosamente e proferiu: “Rapaz, rapaz. Mente vazia é oficina da tentação. O homem que não trabalha, não se cria, continua sendo menino. O tempo livre quando nos é muito, nos atormenta em ciúmes, em vaidades, em luxúrias. É necessário muito caráter e força para resistir as tentações quando não ocupamos a nossa mente. Ocupa-se. Trabalhe muito. Trabalhe até sentir-se cansado. Nós, os velhos, sabemos que a mente que se mantém ocupada, padece com maior lentidão.”.”. 



Uma das mais brilhantes coisas que já li, foram as 45 lições escritas por Regina Brett, publicada na coluna do The Plain Dealer, na celebração do seu 90º aniversário. É claro que foram as 45 enumerações que ela viveu, e muito provavelmente, quando atingir esta idade, faça uma lista diferente. No entanto, o que me fascina em suas preleções é um item polêmico: “pode ficar bravo com Deus. Ele supera isso”. Sim! Você pode! Você pode às vezes desconfiar da sua crença, seja lá como Deus for verdadeiramente em imagem e maneiras, Ele aguenta e entende. 

O ser humano entende uma parcela da vida quando aceita que não é especial. Todos estamos sujeitos ao sofrimento e são justamente essas fases de difícil superação que nos faz sermos quem somos. Temos que passar essa etapa de perder tudo, inclusive a fé, para nos reerguermos. Temos que desafiar ao máximo a nossa força para podermos compreender que, sim, tudo passará. São poucas as frases mais inteligentes do que “nada é para sempre”. Porque nada, nem o nosso corpo, dura intacto e perfeito durante toda a vida, e, um dia, ele perde o que chamamos de vida. 

Quando tudo desaba, nós caímos na tentação de nos questionarmos: “Por que isso aconteceu comigo?”. Por quê, se eu sempre fui tão honesto, se não faço mal a ninguém, se vou a igreja todos os domingos pela manhã? Não há motivos. Temos que aprender a aceitar a maneira com que as nossas vidas caminham. Se procurarmos por aí, há uma imensidão de pessoas que também perderam filhos, casas, sofreram enfermidades, e, continuam sendo pessoas boas, integras e que não eram merecedoras de tanto sofrimento. Repito: Não somos especiais, todos estamos sujeitos aos acontecimentos trágicos e só entenderemos uma parcela da vida quando aceitarmos isso e conseguirmos continuar [sobre]vivendo. 

Meu pai, homem de tremenda e admirável força, que me criou para tomar decisões importantes e sentar à mesa dos negócios para intermediar qualquer trabalho como uma grande negociação, disse-me, certa vez, que nós devemos impor um prazo para a nossa recuperação após uma queda. 48 horas. “Tu tens 48 horas para sofrer, depois disso tens que respirar fundo, levantar a cabeça e se reconstruir. São 48 horas porque tu és jovens, para mim, me dou oito.”. 

 Foi meu pai que me ensinou a não remoer o passado, a não ficar me perguntando os motivos, mas a aprender como o tempo é urgente. Não existe destinos, não haverá “deixa ser o que for”, quando nos dermos conta, a vida já foi, as pessoas já foram, e, nós, continuamos aqui. Não se pode esperar que o tempo arrume a bagunça e coloque as coisas no lugar, somos nós que comandamos a nossa vida. A única coisa que podemos fazer é tomar uma atitude nesse momento para que aquela pessoa fique, aquele trabalho dê certo, aquele livro seja lido. 

Nem a Bíblia nos promete destinos, quem dirá livros de auto ajuda. Ah! A Sagrada Bíblia! O livro mais importante já escrito, você acreditando nele, ou, mesmo tendo fé de que foi a invenção para controlar toda a humanidade, para nos colocar medo. Encontro pessoas por aí que se dizem ateus e nunca abriram o livro sagrado. Se não conheces, como não acreditas? É talvez a maior ignorância do ser humano não acreditar em algo, mesmo que as crenças sejam distintas, é importante ter fé para sobreviver. 

É importante acreditar que o que eu faço hoje é reflexo do amanhã. São esses ditados, essas balelas que todos falam, que devem ser analisadas. Por exemplo, “eu não me arrependo de nada”. Se não te arrependes, então tu nunca erras? O não errar é um grande erro. Todos erramos. E apenas quando há o arrependimento é que há o aprendizado. O erro é válido, meu amigo. Arrepender-se é mais. 

Me arrependo de não ter aproveitado mais aquele amigo que hoje faz tanta falta, de ter sido tão dura com as pessoas e comigo mesma, de me preocupar severamente se iria decepcionar aos outros e, assim, decepcionar a mim mesma. São com esses tapas na cara que estou aprendendo a ser mais leve, a domar minhas vontades e a fazê-las, a respeitar ao outro e a mim. Porque o egoísmo demasiado é horrível, mas a falta dele é intolerável. – Sem esperas, sem destinos, errando... amando... sobreviva! 

Porque, talvez, aquela velha opinião não fosse tão errada assim... 

sexta-feira, agosto 29, 2014

A2


"(...) Tenho períodos de produzir intensamente e tenho períodos-hiatos em que a vida fica intolerável." 

D'AQUI DE DENTRO

“Se nos jogássemos naquela poça-de-lama e fizéssemos todos os rituais de beleza que o mundo implorara, ainda assim estaríamos sujos de barro. O que quero dizer, é que, apesar das roupas caras e sotaque inglês, no fundo, todos nós estamos sujos. Todos estamos fora daquilo que realmente queremos. Estamos à mercê dos padrões que anseiam e eu não tenho orgulho dessa vida.” 

Foto: instagram.com/elizabethmessina

Vomitou um discurso sobre aquela moça que me deu a sensação de que eu estava sendo agredida. “Ela não passa de uma vagabunda!” e me olhara esperando a minha concordância. Não. Eu não concordara. Eu não aceitara a ideia de que aquelas pessoas sentadas naquela mesa que custara mais de um salário de uma família brasileira, poderiam estar julgando uma pessoa porque ela fizera sexo.

Mergulhei na minha raiva, respirei fundo e soltei meu desabafo sem esperar que eles me entendessem: “Talvez ela possua um coração melhor do que o de vocês.”. Ele me cutucou por debaixo da mesa, e disse: “Querida, não seja tão hostil.”. Hostil provavelmente fosse a palavra que melhor descrevesse aquele momento.

Eu apenas continuei: “Talvez ela apenas não se preocupe com os padrões estabelecidos por uma sociedade bíblica do que é certo ou errado. Talvez, no final de cada dia, ela doe mais amor e solidariedade do que as pessoas que frequentam a igreja devotamente. Talvez seja mais honesta do que o marido, pai de família, que vem ao bordel trair sua esposa e depois aponta o dedo para julgar à mulher que lhe deu prazer. Talvez nós sejamos uma população de hipócritas e ela não queira fazer parte disso. Acho apenas que ela tem uma vida mais real do que a nossa.”. Levantei, peguei meu casaco e deixei o restaurante. Não me recordo se eles comentaram algo ou, talvez, eu não tenha prestado tanta atenção assim. 

Minutos após fechar a porta de minha casa, a campainha tocou. Era José. Atônito, tocara a campainha sem parar. Eu estava repleta e consumida pela raiva. Não poderia crer na ideia de que ele era tão mesquinho. Abri a porta na prontidão de lhe dar uns tabefes, mas, de repente, eu lhe vi. Vi seus olhos de menino que não entendia nada sobre a vida. Me lembrei de que aquela altura eu já estaria apaixonada. Deixei os “nãos” de lado e o abracei. Resolvi que se eu consegui amá-lo, conseguiria mostrar a ele que a vida era muito mais que um prato de lagosta a beira-mar. 

O primeiro ensinamento que pude compartilhar com o meu amado José foi o perdão. Quem se cria na rua, mesmo que tenha família o esperando para o jantar no fim do dia, aprende que o perdão é fundamental. Não só porque estamos sujeitos ao erro e a ter que nos desculpar constantemente, mas também pois perdoar nos causa paz. Tira um peso das costas que não temos a necessidade de carregar. Perdoar José, pelas crenças que obteve em sua família de classe A, foi um dos maiores desafios que eu enfrentei. No entanto, foi tão rápido quanto ferver água. 

Não éramos namorados. Não estávamos noivos, nem eu fora sua amante. José era um jovem de família rica que se formou em medicina e que me conheceu em um balcão de bar, dormimos na primeira noite. Muitas moças daquela época teriam esperado um mês ou dois para conhecer a sua casa, mas eu estava curiosa para saber se ele era ou não o homem da minha vida. Era. E eu soube disso naquela mesma ocasião, enquanto ele dormira no seu travesseiro de penas e eu o observara calmamente. 

Nós nos víamos repetidamente, todos os dias, a nossa rotina era estarmos juntos. Não era bem uma história de amor tradicional. Ele era um rapaz bonzinho que precisara ser sacudido. Eu era uma menina criada na religião do “coma com a boca fechada, agradeça e peça desculpas”, que levara a vida com certa malícia e diversão. Não andávamos de mãos-dadas e nem costumávamos sair juntos, nas raras ocasiões que tentamos trazer um para o mundo do outro, dava sempre tudo muito errado. Não éramos para ser, mas éramos. Então, ele vivera a vida dele, eu a minha e, no fim da noite, a campainha sempre tocara. 

Aos poucos, todas as boas-maneiras de José foram substituídas pela realidade com que eu conduzira meus passos. Ele não visitara mais seus amigos fresquinhos, tinha na cabeceira da cama os livros que eu indicara, sorria e ria, gargalhava, dos meus desajustes e piadas, adorava quando eu aparecia de surpresa no seu consultório e fazíamos da sua mesa cheia de instrumentos, que eu não sei para quê os médicos utilizam, o nosso ninho. Nós não tínhamos regras. E isso era adorável. 

Quando aceitamos que o outro pode nos transformar e mergulhamos de cabeça na piscina de água fria, sem que antes nos preocupemos em medir a temperatura, não é só amor. É um dos mais saudosos milagres que Deus pode nos conceder: estar ali, sem horários agendados ou planos para o futuro, com alguém que nos faz ser melhor

Sem limites invisíveis, não sentiremos vontade de ultrapassá-los. Nós só almejados estar ali. Ali. Ali naquele trabalho, ali naquela mesa escrevendo algo, ali naquele telefone vendendo a mercadoria, ali naquela sala atendendo o cliente, ali ao lado daquela companhia. Nós trabalhamos, aos pouquinhos, as nossas vontades e fazemos delas o nosso aconchego. 

O nosso lar recebe o nosso jeito e, lá fora, os outros jeitos não nos dizem nada. A grande barreira da vida é construir nosso lar sem influências do que os outros querem ver. Às vezes eu não vá utilizar muito aquela escada e uma casa de um só andar seja muito mais confortável. Sem dramas. Sejamos simples. Quero que José entre sem alarmes e acredite que aqui dentro pode ser um lugar mais bonito.

domingo, agosto 24, 2014

A1

“Acho que você tem que enfiar a cara na lama, de vez em quando, acho que você tem que saber o que é uma prisão, o que é um hospital. Acho que você tem que saber o que é ficar sem comer por quatro ou cinco dias. Acho que viver com mulheres loucas faz bem para a espinha. Acho que você pode escrever com satisfação e liberdade depois de passar pelo aperto. Só digo isso porque todos os poetas que conheci têm sido uns frouxos, uns parasitas. Não tinham nada pra escrever, exceto sua egoísta falta de persistência.”

  Charles Bukowski

INSISTIR EM MIM

"Tolerando todo o exibicionismo exagerado daquele cara, ela engoliu seco as palavras que havia ensaiado em frente ao espelho e entendeu que ali não era o seu lugar. Às vezes nós só precisamos entender que não nos encaixamos ao mundo de quem nos interessamos, pedir outra bebida e voltar para casa."



Precisamos de velocidade nos pés para correr e lutar por um amor. Ah! Quanta beleza existe numa guerra quando ela é traçada pela vontade de estar ao lado de alguém! Mas até que ponto a batalha é válida? Será que todas as vezes que lutamos por alguém, nós não estamos, na verdade, insistindo? 

Há uma imensidão de diferenças entre as palavras "lutar" e "insistir" quando a matéria tratada é o amor. Lutar é entrar numa guerra onde os dois lados estão dispostos a ganhar algo, mesmo que muitas vezes os objetivos sejam contraditórios. Insistir é persistir numa batalha que já terminou e que, provavelmente, nós já perdemos. 

O grande problema daqueles que sofrem por um amor é que eles costumam insistir. Acreditam demasiadamente na ideia de que o companheiro é único. Fecham os olhos para novas oportunidades e se prendem ao egoísmo de não aceitar a derrota. Não é o amor que machuca, é o orgulho ferido. 

Acredito que, em todas as áreas de nossa vida, o orgulho é prejudicial. Temos que aceitar a perda, no entanto, não precisamos desistir de todo o resto. É preciso levantar a cabeça e recomeçar. O luto da perda já foi incrivelmente calculado pelo homem pelo lapso de apenas sete dias, depois disso, é necessário esquecer e continuar.

Eu, porém, não respeito os sete dias de luto. Eu me espelho no tempo que não para, e, não paro. Visto outra roupa, peço um Cosmopolitan e observo os lados. Porque nós acreditamos que olhar para frente é o segredo, mas são os lados que guardam as surpresas. 

Vivemos anos e anos de nossas vidas e poderemos viver mais anos e anos, mesmo que longe da pessoa amada. Apesar de poético, nós não iremos amar uma única vez nessa vida. Nós devemos colocar na balança "o que queremos" contra "o que nos faz bem". Será que é necessário engolir a seco o que nos faz mal para termos apenas o que queremos? O preço da insistência é confundir o que nos faz bem com o que está nos matando.

O ser humano costuma aceitar o amor que acha que merece, porém ele sempre aceita menos. Devemos nos olhar a fundo e enxergar todas as nossas qualidades para notarmos que merecemos e aguentamos batalhas maiores. Precisamos ter fé.

Fé de que existem bilhões de pessoas no mundo, fé de que hoje não é o último dia de nossas vidas, fé de que nós iremos superar esse período mesmo que estejamos sós, fé de que encontraremos alguém que não precisaremos insistir, e, talvez, nem lutar. É preciso ter fé no que, agora, parece impossível.

Que a nossa batalha seja para encontrar a fé em nós mesmos e que possamos abandonar a crença de que sozinhos seremos fracos, porque se tem algo que eu aprendi nesses anos de solidão, é que só poderemos saber o tamanho da nossa força se não tivermos onde nos apoiar. E, ainda assim, todo esse tempo, eu me apoiei em minha esperança.

quinta-feira, julho 03, 2014

JULHO, I

"Deve ser porque sou do tipo que mete a cara. Que mergulha, se afoga, se fere e se recompõe – mas não deixa de ser quem é nem por um minuto. Porque prefere ser julgada a ter que se omitir. É por isso que eu gosto de quem se mostra inteiro e permite que eu faça o mesmo. Não me surpreende, também, que este adorado adjetivo – que não saiu da minha cabeça por dias, não sossegou até ser despejado no papel – seja considerado uma patologia, seja empregado pejorativamente. Seja confundido, comumente, com tagarelice. Dane-se, eu amo mesmo assim – aliás, tudo o que amo nesta vida tem um quê de loucura e esquisitice. Sem tentar, nem por um minuto, ser técnica – até por que a minha posição não me exige isto – arrisco dizer que os verborrágicos são diferentes dos tagarelas, e diferentes pra melhor, por assim dizer: não me refiro ao que fala sem parar, sem filtro e sem bom senso. Não. O verborrágico fala muito e fala o necessário. Fala o que sente, o que pensa, o que o outro precisa ouvir. Fala com os instintos e com o coração. O verborrágico ao qual me refiro é aquele que não tem medo de se cuspir pela boca. De dar vazão à alma através dos verbos. É o que te abraça com dezenas de sílabas. É quem não tem medo de se traduzir. É o que se dá ao luxo de se mostrar em um mundo em que cada palavra pesa contra você. Que me perdoem os monossilábicos, mas eu gosto é de quem se expressa."

Nathalí Macedo em "A verborragia e o meu apreço por pessoas que se mostram por inteiro", Entenda Os Homens

quinta-feira, maio 29, 2014

MAIO, IV

"Eu sou feita de madeira 
Madeira, matéria morta 
Mas não há coisa no mundo 
Mais viva do que uma porta. 

Eu abro devagarinho 
Pra passar o menininho 
Eu abro bem com cuidado 
Pra passar o namorado 
Eu abro bem prazenteira 
Pra passar a cozinheira 
Eu abro de supetão 
Pra passar o capitão. 

Só não abro pra essa gente 
Que diz (a mim bem me importa...) 
Que se uma pessoa é burra 
É burra como uma porta. 

 Eu sou muito inteligente! 
 Eu fecho a frente da casa 
Fecho a frente do quartel 
Fecho tudo nesse mundo 
Só vivo aberta no céu!"

A PORTA, VINICIUS DE MORAES
Rio de Janeiro , 1970 

EU QUERO DOÇURAS

"Não, rapaz. Esta moça não sou eu. Eu não tenho traumas. Não tenho uma história triste para lhe contar e, se puder seguir ao meu lado, tens que sustentar a ideia de conviver com quem sorri de tudo. Não falo sério e nem corro riscos. Não nado contra a correnteza, eu flutuo com ela. Eu sento no banquinho em baixo da palmeira e observo o movimento das pessoas sem me preocupar com os horários. Estou sempre atrasada e não planejo um futuro. Eu vou indo...".



Há pessoas de todos os tipos. Encontramos algumas que nos fazem bem e outras nem tanto. Já me deparei com quem se apaixona fácil, com quem está sempre preocupado com o trabalho, com quem não tem tempo para sentar no barzinho às quintas, com quem sempre está com o tempo livre e com quem tem medo de se relacionar. Essa última sempre foi o meu maior medo. Não porque eu procuro alguém que queira um relacionamento, mas porque eu achei por muito que eu fosse uma delas. Não era. 

Nunca tive medo de relações. Não temo a ideia de manter laços. Acho bonito encontrar amigos e amores com quem podemos conviver e compartilhar não só nossas dores, como também nossos momentos felizes. Dividir domingos. Marcar um encontro para colocar o papo em dia ou ir ao cinema. Andar de mãos dadas. Discutir sobre política e respeitar a decisão de que “já é tarde, tenho que ir embora”. É linda a simplicidade das relações. E ela me encanta. 

No entanto, não é fácil ceder. Não é tão simples abrir um espaço para que alguém possa entrar sem bater na porta. Não é como regar flores todas as manhãs. É preciso muito mais que água e temperatura ambiente para que esta árvore dê frutos. Exige-se empenho. Sacrifício mútuo para o benefício de ambas as partes. Não é só deixar a porta encostada, temos que confiar a chave da fechadura. 

Eu não guardo o medo de entregar as chaves. Eu não temo a ideia de não encontrar alguém, eu temo a ideia de que, ao encontrar, essa pessoa não cuide da chave, nem da porta. Eu tenho medo de não ser amada. De passar uma vida ao lado de alguém e, no final, não me sentir amada. Eu aguentaria um casamento de altos e baixos, aguentaria a infidelidade, aguentaria vê-lo indo embora, mas não suportaria a ideia de que meu companheiro não me amou. – Não suportaria a decepção sobre a única coisa da qual eu sei escrever: amor. 

Vivemos para entregar pedacinhos de nós às outras pessoas. Nós somos todos os pedacinhos que já recebemos. Eu tenho um pouco do João, da Maria e do Carlinhos, e você vai ter um pouquinho de mim. As transformações do que somos vão acontecendo conforme as relações que mantemos. E quantas dessas relações nós podemos dizer que são especiais? Nem sempre nós somos especiais, já diria o poeta “às vezes nós só estamos preenchendo lacunas”. 

Eu não quero preencher o espaço vazio de ninguém. Não quero ter a ideia de que estou aqui só para não terminar sozinha. Eu quero encantos. E é por isso que eu vou deixando a porta encostada... Uma hora alguém leva a chave. Mas que a carregue por vontade própria e que segure-a para não perde-la por aí, porque não farei cópias e, apesar de estar aqui sentada, o tempo me custa caro.

quinta-feira, maio 22, 2014

MAIO - III

"Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine. E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria. E ainda que distribuísse toda a minha fortuna para sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, e não tivesse amor, nada disso me aproveitaria. 

O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece. Não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal; Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade; Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor nunca falha; mas havendo profecias, serão aniquiladas; havendo línguas, cessarão; havendo ciência, desaparecerá; Porque, em parte, conhecemos, e em parte profetizamos. Mas, quando vier o que é perfeito, o imperfeito desaparecerá. 

Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, discorria como menino, mas, logo que cheguei a ser homem, acabei com as coisas de menino. Porque agora vemos por espelho em enigma, mas então veremos face a face; agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido. Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três, mas o maior destes é o amor."

 1 Coríntios 13:1-13

TRAGO-LHE FLORES AZUIS

"(...) Você pode até duvidar.
Acho que isso não é amor."
LEGIÃO URBANA




O telefone tocou. Era ele. Estava na cidade e queria vê-la. Sem pensar muito sobre o assunto, ela aceitou o convite. Vestiu seu melhor vestido, escolheu o par de sapatos e, na boca, batom vermelho. Ele atrasou-se dez minutos, ela atrasara vinte. No jantar, ele fora cavalheiro, puxou a cadeira, não economizou na hora de escolher o vinho, conversaram e discutiram suas vidas adultas. Eram eles outra vez. Embora por fora fossem pessoas diferentes, por dentro ainda eram os mesmos olhares jovens de quinze anos. Por certos momentos eu quase enxerguei o brinco de pena e a jaqueta de couro. 

Após o jantar, a sobremesa. Ela ainda escolhera torta de limão e ele pedira o mesmo pedaço de bolo de chocolate. Ela tentou resmungar querendo dividir a conta, ele não aceitou. Saíram do restaurante e caminharam pela rua. Mãos dadas. Sorrisos paralelos que se encontravam ininterruptamente. Ele a levou para o hotel e, quando as roupas já se encontravam pelo chão, tiveram a certeza de que o tempo para eles não passou. Repito: Eram eles. Outra vez. 

Mas a manhã surgira e o sol batera no rosto de Alícia. Ele tinha que pegar o avião e não pôde ficar para o café, então ela sentou-se à mesa e serviu-se do melhor pão-de-queijo da cidade. Perguntou-se várias vezes, ali sentada, se a noite anterior fora um erro. “Outra vez! Meu Deus! Outra vez!”. Incrédula sobre a sua história com Arthur, decidiu deixar a mesa, pegar a bolsa e ir caminhando até a sua casa. Evitou os táxis. Queria escutar o barulho dos carros e das pessoas sempre atrasadas para o trabalho. 

Ele continuou sua rotina de reuniões com os sócios e rivais. Fechou mais um negócio, comprou outra ação, dividiu recursos e sabe-se lá o que mais fez com todo o seu dinheiro. O dia tivera sido perfeito para a economia. Enquanto isso no peito sobrava o vazio. Não era saudade. Não era vontade de vê-la de novo. Era medo de repetir a dose de culpa. Mais uma vez ele a deixara cheia de esperanças. 

Ao final do dia o telefone tocou. Era ela. Pensou e não atendeu. Repensou e retornou a ligação. Do outro lado da linha, a voz de quem chorou. A voz dela sufocada. A voz era a voz mais triste que já havia se escutado por ali. “Passa na floricultura, compra-lhe flores azuis e leva até ela”, Alícia suplicou. E ele foi. 

Chegou ao cemitério e procurou o nome. Nas lápides escondiam-se segredos e histórias que nunca mais seriam descobertas. Encontrou, sentou-se, deixou as flores e ligou para a Alícia. Era a melhor amiga e Alícia não conseguiu ir ao velório. Fora avisada tarde demais e as cidades eram distantes. Ele ligou, descreveu o túmulo e ela perguntou: “O que está escrito?”, ao que Arthur respondeu doce e delicadamente: “Flores azuis são grandes provas de amor”. 

As flores não foram endereçadas a Alícia. Não foram entregues ao seu apartamento com um enorme cartão de mensagens previsíveis. Mas eram flores azuis... E por trás da grande culpa que se guarda em um cemitério, existira um sentimento que se preocupara em passar na floricultura. Ele poderia ter mentido, dito que foi e não foi. E algum dia ela saberia, pois visitaria o lugar e a descrição estaria errada. Mas ele foi. Ah! Ele foi! E dividiu a dor de Alícia esperando que ela cessasse. 

E quem é que vai dizer que não era amor? Talvez fosse a maior prova de amor que já fora feita. Não pelas flores, mas por dividir a dor. Às vezes nós não precisamos de palavras confortantes, só necessitamos de alguém que fique do outro lado da linha dividindo o peso de não podermos fazer mais nada. Se Arthur e Alícia terminaram juntos eu não sei, não posso saber, mas sei que naquele momento eles finalmente entenderam que precisavam um do outro. Não todas as horas, mas sempre que pudessem.

terça-feira, maio 20, 2014

MAIO, II

"(...) Existe apenas um pecado, um só. E esse pecado é roubar. Qualquer outro é simplesmente a variação do roubo. Quando você mata um homem, está roubando uma vida. Está roubando da esposa, o direito de ter um marido, roubando dos filhos um pai. Quando mente, está roubando de alguém o direito de saber a verdade. Quando trapaceia, está roubando o direito à justiça." 

 O CAÇADOR DE PIPAS, KHALED HOSSEINI

ENTRAR NESSE BLOCO

"Nem sempre terminar um relacionamento é cessar o amor. Quem já dividiu o travesseiro alguma vez, sabe que quando a cama fica vazia, o coração pode continuar cheio. As lembranças nos acompanham por meses, quiçá, anos. Temos que enfrentar algumas fases do término: evitar lugares, alterar a rotina, afastar-se de alguns amigos em comum, conhecer novas pessoas e seguir em frente. Não se perde no passado apenas aquela pessoa, ficam-se momentos, sonhos e segredos. Fechar a caixinha de lembranças e abrir-se para uma nova história é um desafio que exige coragem. E eu não posso mais temer as mudanças."



Ao contrário do que dizem por aí, o tempo não é o grande causador das mutações em nossa personalidade. O que somos hoje é fruto de nossas experiências passadas. Refugiar-se em casa e esperar que a vida aconteça não soluciona os problemas aqui de dentro. A gente precisa sair e dar a cara a tapas para lembrar de tudo aquilo que nós deixamos na espera enquanto vivíamos as ilusões de mais uma história de amor. O tempo por si só não faz milagres. É preciso jogar-se nesse carnaval.

Hoje fui pega de surpresa com algumas palavrinhas que eu havia deixado para lá enquanto me recuperava da pequena tempestade que passou em minha vida. Sabe o que é mais engraçado? Quando passa, se vê que era mesmo uma tempestade em copo d’água. E que ninguém morre de decepção, nem de amor. As feridas cicatrizam, e o esquecimento leva todos os machucados e seus motivos.

Me lembraram o quanto é bonito ter consideração por alguém. Consideração. É possível amar alguém sem ter consideração por aquela pessoa? Eu sei que por muitas vezes escrevi sobre respeito e amor, mas quantas vezes eu citei a palavra “consideração”? Nenhuma.

A consideração é o primeiro passo para o respeito. E não existirá amor que suporte uma relação sem essas duas palavrinhas. É preciso preocupar-se com a outra pessoa, saber o quanto ela está satisfeita com as suas atitudes, colocar-se no lugar dela, renovar aqueles votos.

Amar é tentar fazer o seu parceiro feliz. É abrir mão do futebol de quarta-feira, da noite das meninas, daquela reunião de negócios que pode ser adiada... É entender o futebol de quarta-feira, respeitar as amizades que são importantes para o seu companheiro, compreender o esforço da sua carreira profissional. É ouvir os dois lados e, juntos, formar uma só voz.

Me desculpem se estou sendo sentimental. No entanto, quando é que o romantismo saiu de moda? Todo relacionamento precisa de romance. Todo romance exige uma certa atenção. Ninguém está pedindo para que portas de carros sejam abertas e que flores sejam entregues na segunda-feira pela manhã, nós só precisamos de consideração.

Precisamos quebrar esse gelo que anda endurecendo nossos corações e acalmar a alma com um pouco de carinho. Precisamos regar a semente da sedução, da adoração, do gostar. Acordar todos os dias e fazer com que a pessoa amada se recorde porque é que ela aceitou sair com você aquele dia, porque é que ela insistiu em continuar, porque é que ela se apaixonou por você. Não deixar a rotina tomar conta e ter uma rotina mesmo assim.

Ter um relacionamento é enfrentar o desafio de conquistar, todos os dias, a mesma pessoa que você já conquistou há anos. É não deixar que o amor envelheça, nem a relação, nem a conversa. É considerar o sorriso da sua bem-amada a coisa mais importante de sua vida.

É hora de esvaziar os copos e encher o coração. Preencha-se! A vida é um bloco de rua e quem não dança essa marchinha, perde toda a diversão. E, meu amigo, a diversão mais sincera é entregar-se à um amor.

quinta-feira, maio 15, 2014

MAIO - I

"Não é necessário melhorar a aparência, adquirir muita cultura, aumentar o salto do sapato, levantar mais o nariz. Precisamos diminuir o barulho, caminhar mais devagar, prestar atenção em quem chega, abaixar a cabeça e colocar a humildade pra funcionar. Somos grandes, quando somos pequenos."

 ITA PORTUGAL

OS GRITOS DA CIDADE



Todos os dias escutamos os gritos de uma cidade que pede socorro: sirenes, buzinas e os freios dos carros. Mas e o barulho que ninguém escuta? Para onde vão os nossos silêncios quando deixamos de dizer o que sentimos? São os silêncios falantes que mais sufocam. O calar da vontade, do segredo, do amor. Às vezes as palavras escorregam e se perdem pelos cantos. Enquanto por fora elas são apenas silêncio, por dentro são gritos. Os gritos que ninguém escuta.

Nós escondemos as nossas perdas e acho que não há a necessidade de deixarmos à mostra. No entanto, como é que nós vamos conseguir lidar com as perdas que não temos coragem de perder? São tantos segredos que a nossa alma carrega e tantas dores que se perdem em cada músculo, que talvez deixar um pouquinho exposto, aliviaria o peso.

Vivemos pesados, sobrecarregados, cansados. Outro dia escutei “nós não sabemos a hora de parar”, e não sabemos mesmo. Porque não paramos. A vida é uma linha contínua de acontecimentos. Não tem fim. E, em minhas crenças, creio que nem após a morte nós teremos realmente um final. E é por causa dessa continuação irreparável que tudo que precisa ter fim em nossas vidas, tem que ter fim. Porque o que não acaba agora, volta a atormentar lá na frente. Histórias inacabadas, cedo ou tarde, ganham novos parágrafos.

Então toda voz que cala aqui dentro, um dia terá que ser enfrentada. Ai daqueles que tem de enfrentar um grito calado por anos! É como ficar anos sem se olhar no espelho e, de repente, se ver refletido mais velho, com rugas, careca, totalmente diferente da última vez. A voz que cala também cresce, ela aumenta, ela acumula novos dizeres, mais dores, mais sufocos, mais traumas.

Silenciamos por medo, silenciamos a dor, silenciamos a vontade, silenciamos o amor e tudo se torna segredo. Essas feridas nos tiram o sono, nos deixam sentados por horas no sofá pensando em tudo o que deveria ter sido dito e não foi, e agravam a situação. Muitos problemas poderiam ter sido resolvidos com uma conversa. E, mesmo assim, nós nos calamos.

Precisamos trabalhar uma maneira de soltar a voz que trava. Expor o que nos afeta não é fraqueza. É preciso muita coragem para ser franco. A honestidade da franqueza diminui as feridas que não fazem barulho nessa cidade.

É hora de parar de perder a chance de contar à aquelas pessoas o quanto gostamos de estar ao lado delas, como é hora de pedir para que se esforcem um pouco mais e nós possamos permanecer aqui. É hora de colocar para fora o que sentiu quando perdeu aquela oportunidade, de conversar sobre o seu medo, de discutir sobre a sua dúvida. Nós já podemos dispensar o terapeuta. De agora em diante, nós vamos gritar tudinho, ou pelo menos, quase tudo. Hora de encarar o espelho e terminar aquela conversa que ficou pra hoje... 

quarta-feira, abril 23, 2014

23-04-2013

“Mas se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros. Os outros me fazem entrar debaixo da terra. Os teus me chamarão para fora da toca, como se fossem música. E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim não vale nada. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens cabelos dourados. Então será maravilhoso quando tiveres me cativado. O trigo, que é dourado, fará com que eu me lembre de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo...” 

O PEQUENO PRÍNCIPE, ANTOINE DE SAINT-EXUPÉRY

VALENTINO

“Todos os dias, nessa cidade, pessoas acordam, vestem suas roupas e seguem até o trabalho. Abandonar o pijama em cima da cama e se preparar para um novo dia é sempre o horário mais difícil. Não é só a roupa de dormir que nós deixamos, são os sonhos, todos os sonhos.”



Acordou atrasado, correu, vestiu-se, pegou o ônibus. Perguntou-se por que a senhora do segundo banco carregara uma espécie de bíblia com um chaveirinho escrito “Graça”. Desceu no ponto. Contou os passos até o trabalho. Perdeu-se em pensamentos. Pegou a chave no bolso. Abriu a porta. Deu o primeiro passo. Disse a si mesmo que seria um bom dia para trabalhar. Mentiu.
A conta de telefone estava atrasada. O senhor Carlitos não levou os documentos que prometera. Em cima da mesa uma pilha de serviço e nenhuma solução. O telefone tocara num intervalo de trinta minutos. O supervisor analisara o tempo que se foi perdido pensando em por onde começar. O mundo parecia estar contra todos os compromissos que ele tivera. O coração era abatido com o estresse do dia-a-dia. Quem é que tem vontade de continuar quando em volta só existe confusão?
Talvez a fé seja aquele pedacinho que sustenta quando o corpo está cansado. O rapaz soubera muito sobre a fé. No entanto, tinha pouco conhecimento sobre rotinas. Não queria prender a mente entre quatro paredes. Trabalhar dentro de um escritório nunca fora sua vocação. Se pudesse largar tudo e varrer as ruas da cidade, talvez fosse mais feliz. – Ele só gostaria de poder andar descalço. – O que era um afronto visto que muitas pessoas desse país sonhavam em ter um par de sapatos. Acho que ele só queria ter os pés livres.
Horário de almoço. Andou até o restaurante de esquina com o desejo de acender um cigarro, mas os colegas de trabalho não apreciariam o cheiro durante a tarde. “Proibido fumantes”, pensou. Chegou no restaurante. Tentou se lembrar da mesa que tivera escolhido da última vez, lembrou, sentou na mesa ao lado. Acenou para o garçom. O garçom fora cordial. Terminou a refeição. Fora até o caixa. A moça do caixa mencionou que sempre o vira, e percebera como ele sempre sentara em uma mesa diferente. Respondeu que sofrera de “medo de costumes”. Saiu. E, quando atravessara a rua, a enxergou. Os mesmos passos. O mesmo sorriso. Carregara flores no cabelo. Ah! Era ela! Outra vez era ela e outra vez ele a evitou. Voltou ao trabalho pensando por onde ela andou desde a última vez... Resolveu deixar pra lá.
O senhor Carlitos o esperara em sua mesa. Os documentos prometidos em suas mãos e todas as reclamações possíveis. Sentou-se. Colocou a mão no queixo. Escutou as lamentações. Mas não lidou com as inúmeras tarefas daquele senhor naquele dia. O rapaz e seu velho hábito de deixar tudo para depois...
Fim de expediente. Contou os passos até o ponto. Pegou o ônibus. Equipou-se de fones de ouvido. Fechou os olhos enquanto escutara Jack White. E, de repente, uma voz. Virou o rosto e a fitou, boquiaberto, com a música ainda em seus ouvidos. Ela havia entrado no mesmo ônibus que ele, sentado ao lado dele, dito seu nome.

“ – Consigo enxergar em seus olhos o medo que tens de me encontrar.”, ela disse. Mas ele só conseguira ficar olhando as flores no cabelo.
“ – Comprei um disco novo. Acho que você vai gostar.”, insistiu. E ele a questionou sobre o artista.

Conversaram até chegar a vez de ele descer. Se despediu. Pensou em quantas vezes mais partiria seu coração se despedindo dela. Lembrou-se das primeiras palavras que ela disse. Sim. Ele tivera medo. Ele tivera medo de encontrá-la, de encará-la, de vê-la feliz com a sua nova vida. Ele gostaria de ter a coragem dela. Afinal, não é qualquer pessoa que usa uma flor no cabelo.
Chegou em sua casa. Vestiu-se, outra vez, de sua roupa de sonhos e deitou-se em sua cama. Fitara o teto enquanto imaginara como os velhos amigos estariam agora... Pensou em ligar para ela. Resistiu. Tentou pensar sobre o trabalho. Não conseguiu. Recordou-se da tristeza de seus pais. Decidiu dormir.
E esse era sempre o seu maior erro: deixar para lá, resistir, não tentar, não lembrar, não pensar. Continuar vivendo a vida que ele não vive. Não perdoar seu passado. Não acreditar em algo. Não correr riscos... Já reparou em quantos “nãos” nós colocamos em nossas vidas? O rapaz rimara versos enormes de negativas, enquanto a vida só espera um “sim”. Como a senhora que carregara um chaveirinho esperando uma graça, a vida carrega pessoas esperando que elas andem com seus próprios pés. O rapaz que lamentara o leite derramado durante o dia é o mesmo que correra descalço em seus sonhos durante a noite. Só faltara uma coisa: coragem.